Por Michelle Carneiro

Falar de Qualidade de Dados no Brasil foi difícil durante muito tempo. O motivo é que este assunto era entendido como secundário, e não diretamente relacionado aos resultados do negócio. Em geral, as empresas optavam por comprar listas de prospecção ao invés de trabalhar com a informação que possuíam dentro de casa, e eles não estavam completamente equivocados. Afinal de contas, quem não quer ter novos clientes? Ainda mais com uma inteligência que permitisse prospectar exatamente o público-alvo desejado, com modelos avançados de segmentação e afins.

Por outro lado, sabemos hoje, especialmente em tempos de crise, que rentabilizar um cliente antigo ou inativo é 5 vezes mais barato do que conquistar um novo. E se quisermos continuar falando em economia, podemos também afirmar que higienizar, tratar e atualizar os contatos da base já existente custa mais barato do que comprar contatos. Isso só prova que em um contexto econômico instável como o que estamos vivendo hoje, Qualidade de Dados passa a ter relevância para qualquer departamento de uma organização.

Qualquer ação dentro da companhia que vise geração de receita ou gestão de riscos precisa ser tomada com base em informações confiáveis. Alguns exemplos são campanhas de marketing, ativação ou reativação de clientes, cobrança, prevenção contra fraude. Mas de que adianta ter essas iniciativas se você está utilizando o telefone errado? Ou mandando a correspondência para um endereço que não existe mais? Ou para um e-mail inválido? Dessa forma, você estará falhando na execução e prejudicando a reputação da sua marca ao receber, por exemplo, reclamações de consumidores que não receberam uma fatura e, mesmo assim, estão sendo cobrados com juros.

E já que tocamos no assunto de e-mail, acompanhe esse raciocínio. Você comprou um livro no e-commerce X. Recebeu um SMS dizendo que a compra foi confirmada e debitada em seu cartão. Lá se vão dois dias (supondo que você é um cliente paciente) e você não recebeu nenhum e-mail confirmando sua compra. Algo claramente deu errado. Seu primeiro impulso? Ligar para a central de atendimento e questionar.

A simpática moça do call center atende, diz que está tudo certo, e que seu livro está programado para chegar em 3 dias. Sua confirmação só não chegou porque você digitou uma letra errada do seu endereço de e-mail. Pronto, corrigido, tudo certo. Agora pense no seguinte: o que custa mais barato: (1) uma ferramenta que faça validação desses e-mails logo enquanto o cliente está digitando, (2) a hora da simpática moça do call center que gentilmente atendeu sua ligação e resolveu seu problema? Opção 1, evidentemente.

Dito isso, vamos para a prática: como criar um processo consistente (e econômico) de Qualidade de Dados? Minha sugestão é dividir em 2 etapas: a corretiva e a preventiva.

Processos corretivos

Quem faz o mínimo em gestão de clientes e/ou fornecedores, sejam eles pessoas físicas ou jurídicas, já tem o que eu gosto de chamar carinhosamente de “base legada”. A tal base pode conter todo tipo de informação: cadastral (nome, endereço, telefone, e-mail), comportamental (frequência de compra, ticket médio), ou mesmo dados importantes sobre o seu produto ou sobre sua operação (cadastro, gestão de estoque, prazo médio de entrega etc.).

É natural que essa base se torne obsoleta ao longo do tempo, por vários motivos: diversas pessoas de departamentos diferentes manuseiam os dados, as informações entram por diversas fontes (ponto de venda, site, televendas, eventos) ou simplesmente porque os dados são perecíveis e desatualizam-se ao longo do tempo. Nós brasileiros mudamos de endereço em média 7 vezes na vida, mudamos de telefone, trocamos de e-mail (especialmente o corporativo, à medida em que trocamos de emprego) e assim por diante. E o desafio permanente é: como manter essa base em ordem?

Há uma série de ações que podem ser tomadas para corrigir uma base defasada. Separei as principais em alguns passos, para ficar mais fácil.

  1. Padronização/higienização: trata-se do processo que prevê eliminar inconsistências e manter a base em um formato único. Pode envolver ações como retirar caracteres especiais, deixar todo o texto em caixa alta e separar os campos do endereço e telefone.
  2. Marcação de duplicidades: aqui você vai identificar na sua base os registros que estão duplicados. Isso pode ser feito levando em consideração dados únicos (como CPF ou CNPJ) ou outras informações, como nome e endereço. Esse trabalho será muito importante para evitar que você gaste dinheiro mandando correspondências duplicadas para a mesma pessoa.
  3. Enriquecimento: a partir dos dados que você já tem dentro de casa, é possível completar sua base com informações adicionais que permitirão que você tome decisões importantes ou passe a tratar seus clientes de maneira diferenciada. Alguns exemplos: data de nascimento, modelos de afinidade, renda, quadro societário.
  4. Monitoria/auditoria: esse processo permite que você garanta a consistência da base ao longo do tempo. Serve como um “guardião” que vai te avisar cada vez que você diminuir seu percentual de preenchimento, aumentar o prazo de entrega de mercadoria ou identificar duplicidades.

Processos preventivos

De nada adianta deixar a base legada tinindo, se todos os novos dados que entram vêm cheio sem padrão ou incorretos. Como tudo na vida, melhor prevenir do que remediar.

Nessa linha, a sugestão é colocar ferramentas de validação na entrada. Esse tipo de ferramenta pode funcionar de 3 maneiras diferentes:

  1. Corrigindo formatação: aqui o objetivo é apenas uma validação simples. Exemplos: o número de dígitos do celular está correto para a localidade, a formação do e-mail contém usuário e domínio.
  2. Validação de existência: essa é uma validação um pouco mais sofisticada. Significa, por exemplo, checar nos Correios se o endereço + CEP é de fato existente. Ou “chamar” o servidor de e-mails para garantir que ele é valido e existe.
  3. Enriquecimento: trata-se da mesma lógica mencionada anteriormente, no tópico “processos corretivos”, com a diferença de que aqui o preenchimento é feito automaticamente no momento de input da informação. Isso possibilita a inteligência, por exemplo, de oferecer um serviço customizado ou descontos variados de acordo com o perfil identificado do cliente.

Tudo vai sempre depender do tipo de negócio. Por exemplo, em uma operação de call center é uma mão na roda ter uma ferramenta que preenche dados automaticamente a partir do CPF – seja para fazer um cadastro novo ou apenas para confirmar dados. O ganho de tempo é incrível, e tempo é dinheiro!

Por outro lado, se quem está manuseando é o cliente final, talvez seja um pouco invasivo pedir CPF se ele não for absolutamente necessário. O ideal é colocar o mínimo possível de campos para preenchimento, mas garantir que eles sejam populados corretamente por meio das ferramentas 1 e 2 descritas acima.

E a roda continua girando...

Fazer bonito na parte preventiva infelizmente não elimina completamente a necessidade da parte corretiva. Isso porque os dados desatualizam, os clientes continuam entrando na sua base por meio de diversos canais, e, portanto, podem aparecer duplicados – e clientes duplicadas significam custos em dobro.

Ou seja, tem que fazer de tudo um pouco. Agora, a periodicidade vai de acordo com a frequência com que você coloca dados novos na base. O recomendável é sempre caprichar antes de grandes campanhas. Para o varejo, estamos falando, por exemplo, de Natal, Black Friday, Dia das Crianças, e daí por diante.

Com isso, os benefícios mais tangíveis são a redução de custo e ganhos operacionais que permitirão alavancar receita. Ao meu ver, executar todas as ações mencionadas acima fazem com que você esteja no “estado da arte”. Mas todos sabemos que é difícil conseguir orçamento para tudo o que desejamos.

Nesse contexto, há diversas maneiras de praticar Qualidade de Dados, que vão desde uma implementação complexa liderada por uma consultoria, até procedimentos simples que serão executados em curtíssimo prazo mas já farão uma enorme diferença. Comece aos poucos, planejando bem e ganhando a confiança dos stakeholders com resultados.

E é claro, eu estou sempre à disposição para ajudar ;)

 

Michelle Carneiro, gerente de Data Quality da Serasa Experian Marketing Services.